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Resenha: Why You Should Read Children’s Books, Even Though You Are So Old and Wise (2019) de Katherine Rundell

Why You Should Read Children’s Books Even Though You Are So Old And Wise de Katherine Rundell

Why You Should Read Children’s Books Even Though You Are So Old And Wise de Katherine Rundell | Foto: Marcela Castelli

Publicado originalmente em agosto de 2019 pela Bloomsbury, o ensaio mais recente de Katherine Rundell sobre literatura infantil vem angariando avaliações positivas da crítica profissional e de grandes nomes do ramo, como Neil Gaiman. Ironicamente intitulado Why You Should Read Children’s Books, Even Though You Are So Old and Wise, ou “Porque voce deveria ler livros infantis apesar de ser tão velho e sábio”, o texto oferece tanto um comentário mais sobre a tradição da literatura infantil quanto uma crítica localizada do estigma em torno de livros voltados para crianças.

Rundell fala a partir de uma posição privilegiada: enquanto professora universitária e autora de romances infantis, a ensaísta tem muita experiência quanto se trata de descrever as reações negativas e os olhares enviesados que recebe quando compartilha a sua ocupação mais criativa. Com sagacidade e perspicácia, Rundell constrói seu argumento a favor da leitura de literatura infantil por adultos, compartilhando com o leitor sua paixão por clássicos como Paddington e refletindo sobre o interdito que muitos se impõem diante de um universo imenso de obras clássicas e contemporâneas por conta de uma mera classificação.

Citando W.H. Auden (“Há bons livros que são apenas para adultos, porque sua compreensão pressupõe experiências de adultos, mas não há bons livros que são apenas para crianças.”), Rundell explica que sua proposta não é que adultos leiam exclusiva ou mesmo primariamente livros infantis, mas que há certas instâncias em que apenas um livro infantil oferecerá a experiência de leitura que você precisa ou procura. Para a ensaísta, “é à ficção infantil que você recorre se quiser sentir encanto, fome e desejo de justiça” (p. 39) e explica que, em seu processo criativo, ela escreve para a pessoa que foi aos 12 anos de idade e para a pessoa que é agora, procurando satisfazer dois apetites muito diferentes,  embora conectados:

“Meu eu de 12 anos de idade queria autonomia, perigo, justiça, alimento e, acima de tudo, um tipo de densidade de atmosfera na qual eu pudesse entrar e ser envolvida. Meu eu adulto quer todas essas coisas e também: o reconhecimento do medo, do amor e do fracasso; do rato que vive dentro do coração humano. Então, o que tento fazer quando escrevo – falhando com frequência, mas tentando – é comunicar com o mínimo possível de palavras as coisas as quais mais urgente e desesperadamente quero que as crianças saibam e que os adultos se lembrem.”

O ensaio de Rundell flui bem e comunica com elegância e assertividade a posição que defende. Embora, enquanto leitora, tenha chegado a este texto já em concordância com o ponto que a ensaísta procurou estabelecer, acredito que Rundell seja capaz de ajudar muitas pessoas a se despirem de seus preconceitos em relação a livros infantis. Sabemos que, quando o assunto é literatura, rótulos muitas vezes atuam mais no sentido de afastar leitores do que cativá-los.

Há estigmas em relação a literatura de ficção científica, distopias, romances YA e literatura policial. O problemático rótulo “chick lit” produz um desserviço duplo, simultaneamente estreitando a noção do que seria literatura de e para mulheres e sugerindo que os livros assim classificados não poderiam ser apreciados por pessoas que não se identificam com essa categoria. Grandes romances amados por pessoas de todas as idades como Little Women, Anne of Green Gables, Treasure Island e Peter Pan atravessaram seu tempo e chegaram a nós como clássicos abraçados pelo cânone, mas muitas vezes são ignorados pela academia não-especializada em literatura infantil e por leitores adultos por causa dos rótulos que os categorizam.

Embora o estudo de Rundell focalize especificamente literatura de língua inglesa produzida no Reino Unido, ela oferece uma análise histórica interessante. A autora demonstra que o preconceito em torno da literatura infantil já era verificado no século XIX – quando o gênero, tal como o conhecemos hoje, se solidificou – e segue forte na contemporaneidade.

Why You Should Read Children’s Books  é uma leitura leve e informativa, na qual Rundell produz um breve, mas criterioso giro pela história da literatura voltada para crianças – de canções a contos de fadas – para demonstrar a complexidade das experiências que obras assim categorizadas podem oferecer a qualquer leitor que se abra a elas. A leitura do ensaio (ainda não traduzido para o português) é recomendável a todos aqueles interessados em refletir sobre o que a literatura infantil – escrita para crianças e para adultos – tem a nos oferecer em tempos tão frequentemente fechados ao encanto descrito e buscado por Rundell.

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