Em tempos marcados pela dificuldade de escutar aquele que pensa de forma diferente, e em que adultos não se constrangem ao se atacarem com insultos nas redes sociais, muitas vezes pode parecer difícil encontrar uma maneira didática de explicar a importância do respeito, do diálogo e da tolerância às novas gerações.
As guerras verbais travadas no Twitter e no Facebook invariavelmente ganham espaço como as principais chamadas de noticiários no horário nobre e as maiores manchetes nos jornais impressos. É difícil (e talvez inócuo) tentar isolar nossas crianças da violência inerente à forma como temos conduzido nossas vidas. Mais do que isso, é necessário mostrar por que elas precisam fazer diferente.
Como comunicar noções de tolerância, ética e respeito em um momento histórico que parece caracterizado por um imenso cansaço institucional que muitas vezes leva a um perigoso questionamento da importância da própria democracia? Há quem se refira ao nosso tempo como a era da pós-verdade, na qual “fatos alternativos” são intercambiáveis com o que entendemos como fatos reais.
Um dos sintomas do nosso momento é a abstenção (e esse é um elemento que se estende a pessoas das mais variadas orientações políticas) de tolerar pontos de vista diferentes. Se há algo que precisamos ensinar para as futuras gerações é a importância da escuta, do respeito e do diálogo.
Em meio a tantos questionamentos, é inegável o potencial didático (e de transformação) que a literatura nos oferece. Talvez seja por isso que o livro de estreia de Onjali Q. Rauf, The Boy at the Back of the Class tenha sido eleito o livro infantil do ano pela Waterstones e tenha sido descrito como “um futuro clássico” após a sua publicação em julho de 2018.
Ilustrado por Pippa Curnick e narrado do ponto de vista de uma criança, o livro conta a história de Ahmet, um menino refugiado. Na viagem de barco até o Reino Unido, ele perdeu sua irmã mais nova e o seu cachorro. O menino também acabou sendo separado dos pais. Abrigado por uma família de forma temporária, ele é matriculado numa escola em Londres.
A carteira vazia no fundo sala agora passa a ser ocupada por Ahmet. Seus colegas tentam fazer amizade com “o menino novo da turma”, mas uma barreira linguística se apresenta: ele não fala inglês. O desalinhamento de Ahmet com os padrões estabelecidos atrai a atenção de crianças que fazem bullying com ele. No entanto, um grupo de amigos olha para o menino de outra maneira, abrindo espaço para a diferença e o aceitando como um deles.
Eles logo ficam sabendo da história complicada de Ahmet, e decidem ajudá-lo a procurar sua família. Como todo bom livro infantil, The Boy at the Back of the Class inclui um grande plano elaborado pelas crianças e uma aventura monumental. O grupo decide que a Rainha Elizabeth pode ajudá-los a encontrar os pais do menino refugiado e, com chá e biscoitos em suas mochilas, saem juntos rumo ao Buckingham Palace.
A autora do livro, Onjali Q. Raúf, é fundadora e presidente da organização de direitos humanos Making Herstory. A organização atua em parceria com outros movimentos para acabar com o abuso, tráfico e escravidão de mulheres e meninas no Reino Unido e no exterior. Baseado em parte nas histórias que escutou quando trabalhava em um campos de refugiados, The Boy At the Back of the Class é o livro de estreia de Raúf e foi imensamente elogiado.
O livro carrega, na sensibilidade com que aborda temas contemporâneos, um grande potencial para abrir um diálogo com crianças sobre diferença e tolerância. Assim, The Boy At the Back of the Class foi eleito o livro infantil do ano pela Waterstones e ganhou destaque novamente este mês, sendo escolhido como livro infantil do mês de abril. Além disso, ganhou o Blue Peter Book Award 2019 na categoria ficção.
Ainda aguardamos o lançamento do livro no Brasil!