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HERANÇA DIVINA E MUNDANA: A relação entre pais e filhos em busca de reconhecimento no mundo contemporâneo

Revisão: Gabriela Torreão


Este artigo traz uma leitura sobre as ações da família e seu impacto no futuro. O estudo analisou o comportamento de determinados pais, como os seus modos em relação aos seus filhos, a hierarquia que surge à medida que seus descendentes crescem e como isso afeta as relações familiares. Atrelando ao tema, combina a saga de livros Percy Jackson e os Olimpianos, escrita por Rick Riordan, para comparar a forma como as pessoas na realidade vivenciam a educação com a dos deuses gregos.

 

 INTRODUÇÃO

A Mitologia é um conjunto de mitos estabelecidos por um povo, sendo conhecida também como a área de estudo desses mitos. É uma forma de explicar tudo o que existe e, nesse sentido, é importante dentro de uma sociedade. Os mitos, por sua vez, são histórias que explicam a existência de diversos elementos da natureza e ensinam lições sobre o comportamento humano. A mitologia tornou-se um costume de grande importância na humanidade, uma vez que através dela nasceram religiões, surgiram pensadores e estabeleceram-se sistemas políticos. Dentre algumas mitologias temos: Mitologia Egípcia, Mitologia Nórdica, Mitologia Romana, Mitologia Hindu, Mitologia Japonesa, Mitologia Asteca, Mitologia Iorubá, Mitologia Celta, Mitologia Chinesa e Mitologia Grega — que é a mais importante neste artigo.

Os mitos gregos foram transmitidos oralmente por muitas gerações antes de serem registrados por escritores como Homero e Hesíodo. Essas histórias desempenharam um papel central na cultura grega, influenciando a arte, a literatura, a política e a religião. A mitologia grega apresenta um panteão de deuses e deusas, seres sobrenaturais que governavam diversos aspectos do universo e da vida humana. Esses deuses eram muitas vezes retratados com características humanas, como emoções, desejos e conflitos, o que os tornava mais familiares aos gregos comuns.

A HIERARQUIA DOS DEUSES GREGOS

Na mitologia grega, a hierarquia dos deuses refere-se à organização e classificação dos principais deuses do panteão grego. O panteão grego é liderado pelos doze deuses olímpicos que residem no Monte Olimpo — a montanha mais alta da Grécia. A ordem hierárquica dos deuses olímpicos é vencida por Zeus, o rei dos deuses, seguido por sua esposa Hera, considerada a rainha. Os outros deuses olímpicos incluem Poseidon, Deméter, Atena, Apolo, Ártemis, Hermes, Ares, Afrodite, Hefesto e Dionísio.

A ordem dos deuses gregos não é estática, e as relações entre os deuses muitas vezes refletem dinâmicas complexas de poder, rivalidade e aliança. Essa estrutura hierárquica forma a base para muitas das histórias e mitos da mitologia grega, proporcionando um contexto para as interações divinas e mortais que permeiam essas narrativas.

A DINÂMICA ENTRE OS SEMIDEUSES

Nos livros da saga Percy Jackson e os Olimpianos (2005-2009) escritos por Rick Riordan, os filhos de Zeus, Poseidon e Hades, são referidos pelos semideuses ou outros seres mitológicos como “os filhos dos três grandes”, e isso ocorre devido ao status e influência que teriam comparados aos outros deuses e seus respectivos filhos.

Acontece que, em teoria, os filhos do três grandes do panteão grego têm linhagens mais poderosas e maior probabilidade de aparecer em profecias que influenciam diretamente o que acontece no mundo mitológico — seja de maneira positiva ou negativa. Além disso, possuem poderes extremamente excepcionais que lhes conferem grande força e agilidade, tornando-os um alvo de grande cobiça e até mesmo inveja para outros semideuses.

Mesmo que sejam respeitados até certo ponto, os semideuses filhos dos três grandes nem sempre recebem um tratamento positivo. O fato dos seus poderes serem extraordinários e virem de uma linhagem considerada mais importante significa que eles recebem mais atenção dos deuses e, consequentemente, dos monstros, titãs e de filhos de outros deuses — que não recebem metade daquilo que os filhos dos três grandes podem ter o privilégio usufruir.

Por exemplo, os filhos de Zeus são vistos como particularmente importantes por serem descendentes do rei dos deuses e do Olimpo. Por outro lado, Deuses como Afrodite e Hermes podem ser diminuídos em importância, seja porque seus poderes não são tão assertivos (já que o amor não é algo “exato”) ou, no caso de Hermes, pela má fama de ser também o deus dos ladrões, trazendo uma visão negativa para suas proles. Logo, a relação que se estabelece é de inferioridade entre os próprios semideuses, já que a ideia é que apenas os três grandes — Zeus, Poseidon e Hades — são os mais poderosos, enquanto os outros são considerados filhos de deuses “menores”.

Aliás, Percy Jackson e Os Olimpianos retrata a negligência parental desde o início da vida dos semideuses, com muitos deles sendo deixados com seus pais mortais e enfrentando desafios significativos para chegar ao “Acampamento Meio-Sangue”, onde esperam ser reclamados por seus pais divinos. No entanto, além da problemática citada entre os filhos dos três grandes com os outros semideuses, apenas os doze principais deuses do panteão olímpico são de fato reconhecidos inicialmente pelos seus progenitores, criando assim uma hierarquia que coloca os filhos desses deuses em uma posição de destaque, enquanto outros semideuses que não se encontram ali não têm a chance de sequer serem reclamados.

PAIS DIVINOS E MUNDANOS E A RELAÇÃO COM SEUS FILHOS

A história narra várias situações heroicas, mas ao mesmo tempo consegue explorar a perspectiva de uma criança em transição para a adolescência. Nesta fase, é comum que os filhos se sintam mal interpretados pelos pais, enquanto tentam desenvolver suas próprias personalidades e interesses distintos. A questão das expectativas desempenha um papel fundamental nesse contexto.

Os semideuses são frequentemente enviados em missões designadas pelos deuses para provar algo. Quando têm sucesso nessas missões, isso se torna uma fonte de grande honra para seus pais divinos. No entanto, quando não retornam dessas missões, poucos se compadecem — porque para os deuses os semideuses servem apenas para alcançar glória, e quando morrem, morrem tentando alcançá-la.

Poucos deuses consideram os semideuses como seus verdadeiros filhos e desenvolvem uma relação saudável com eles. Quantos filhos se sentem assim em relação aos pais na realidade? Nascem sem saber o que se espera deles ou de quem são filhos. Muitos se sentem mal compreendidos e sobrecarregados pelas expectativas de seus pais; e essas expectativas podem estar baseadas nas aspirações não realizadas de suas famílias, resultando em uma sensação de inadequação por parte dessas crianças e jovens.

Desde os primeiros anos de vida, os filhos estão sujeitos a uma diversidade de expectativas, tanto implícitas quanto explícitas, estabelecidas pelos pais. Essas expectativas vão desde alcançar certos objetivos acadêmicos ou profissionais até seguir tradições familiares específicas ou escolher um determinado rumo de vida. Contudo, quando os filhos não conseguem ou simplesmente não querem corresponder às expectativas dos pais, isso muitas vezes causa tensões e conflitos no relacionamento entre eles.

A questão da autoridade é igualmente marcante na saga de Rick Riordan e na vida real. Na história, Zeus, rei dos deuses, é retratado como um personagem extremamente rígido e autoritário, resultando em relações fraternas distantes e o peso da perfeição sobre seus filhos. Em um cenário real, estas expectativas impostas podem ser transmitidas de maneira autoritária, isto é: alguns pais comunicam o que esperam dos filhos de forma ameaçadora, como se fossem regras obrigatórias a serem seguidas.

O impacto das expectativas parentais na autoestima e na autoconfiança dos filhos é um dos desafios mais significativos que existe. Quando os filhos percebem que não conseguem atender à tais expectativas, desenvolvem dúvidas sobre si mesmos e sobre as suas capacidades, levando a sentimentos de inadequação e frustração, que prejudicam a sua autoimagem e o seu bem-estar emocional. Por outro lado, quando atendem ou até mesmo superam as expectativas dos pais, a sua autoconfiança fortalece e os laços familiares são estreitados. Infelizmente, esta situação pode criar uma relação de dependência emocional, na qual os pais só conseguem demonstrar amor se os filhos são bem-sucedidos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

As expectativas dos pais exercem uma influência significativa nas interações cotidianas entre pais e filhos, tanto no contexto divino de Percy Jackson e Os Olimpianos, do autor e professor Rick Riordan, quanto na vida real. Muitas vezes, os pais involuntariamente pressionam os filhos para que alcancem certos objetivos ou adotem determinados padrões de comportamento. Isto pode vir a criar um ambiente familiar tenso e competitivo, onde os filhos se sentem constantemente sob avaliação e julgamento com base em seu desempenho. Além disso, a dinâmica entre irmãos pode gerar competição pelo afeto parental, tornando a situação ainda pior.

O resultado dessa dinâmica pode afetar a comunicação e os laços familiares, pois os filhos se sentem desconfortáveis em compartilhar seus sentimentos e preocupações por medo de desapontar os pais. Aqueles que tentam corresponder às expectativas muitas vezes fazem-no à custa do seu próprio bem-estar, saúde mental e identidade individual.

No livro O Ladrão de Raios (2005), quando o filho de Hermes se revolta contra os deuses, todos culpam Hermes por ser o pai do filho que desafia os olimpianos. No entanto, Hermes ainda tenta salvar seu filho, demonstrando o desejo de restabelecer uma ligação em que o filho se sinta reconhecido. Apesar de ser um deus, Hermes reconhece seu erro e percebe que falhou como pai.

Porém nem todos os pais são assim — alguns têm o ego e o narcisismo maiores do que o amor pelo filho; e se uma criança não corresponde às expectativas ou não segue os planos desejados por eles, a culpa recai apenas sobre esse filho. Muitos chegam à vida adulta já sabendo que são vistos como uma decepção por não terem alcançado o que os pais tanto desejavam.

Para estabelecer uma relação saudável entre pais e filhos, é fundamental que os pais reconheçam e avaliem suas próprias expectativas e seu impacto na dinâmica familiar. Isso implica em aceitar os filhos como indivíduos únicos, com habilidades, interesses e aspirações distintas. Ao adotar uma postura mais flexível e empática, os pais podem criar um ambiente familiar caracterizado por apoio mútuo e compreensão, onde os filhos se sintam valorizados e amados independentemente de corresponderem ou não às expectativas impostas.

 

 REFERÊNCIAS

RIORDAN, Rick. O ladrão de raios: Percy Jackson e os olimpianos. 2.ed 1 v. RIO DE JANEIRO: Intrínseca, 2009.

RIORDAN, Rick. O mar de monstros: Percy Jackson e os olimpianos. 2.ed 2 v. RIO DE JANEIRO: Intrínseca, 2010.

RIORDAN, Rick. A maldição do titã: Percy Jackson e os olimpianos. 1. ed 3 v. RIO DE JANEIRO: Intrínseca, 2008.

RIORDAN, Rick. A batalha do labirinto: Percy Jackson e os olimpianos. 1. ed 4 v. RIO DE JANEIRO: Intrínseca, 2009.

RIORDAN, Rick. O último olimpiano: Percy Jackson e os olimpianos. 1. ed 5 v. RIO DE JANEIRO: Intrínseca, 2009.

Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo. Decepções dos pais em relação aos filhos: ajustando expectativas. Disponível em: <https://www.sbpsp.org.br/blog/decepcoes-dos-pais-em-relacao-aos-filhos-ajustando-expectativas/>. Acesso em: 23 de março de 2024.

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