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Dica de leitura: Nnedi Okoraforleitura em 5 minutos

“O africanofuturismo concerne as visões do futuro, interessa-se pela tecnologia, deixa a Terra, motiva o otimismo, é centrado e predominantemente escrito por pessoas de descendência Africana (pessoas negras) e é enraizado primeira e principalmente na África. Concerne menos o “que podia ter sido” e mais o “que é e o que pode ser/será”.

Nascida em 1974, Nnedi Okorafor é uma professora e escritora Najiamericana (termo que a própria cunhou para descrever a inseparabilidade da vivência Nigeriana-Americana) de ficção científica, ficção especulativa, e ficção fantástica – seja na forma de romances como Bruxa Akata (2011), de histórias em quadrinhos como Black Panther: Long Live the King (2017-2018) e de séries televisivas como a adaptação em desenvolvimento de Semente Originária (1980) de Octavia Butler. Ainda que esses gêneros de ficção sejam relevantes na descrição de suas obras, os termos africanofuturismo e africanojujuismo que Okorafor nomeou são ainda mais exatos. Diferente da sua contraparte afrofuturista, o africanofuturismo procura concentrar-se no continente africano ao realizar sua ficção científica, enquanto o africanojujuismo faz isso com a ficção fantástica; reconhecendo e se aprofundando nas narrativas cosmológicas e espirituais africanas. 

Filha de imigrantes nigerianos que foram aos Estados Unidos para estudar mas acabaram ficando em razão da Guerra Civil Nigeriana, Okorafor foi criada no centro-oeste americano na maior parte do ano, de vez em quando passando férias com seus parentes africanos. Seu mestrado e Phd em Inglês são tanto o resultado dos seus estudos de escrita criativa, ficção científica, literatura e jornalismo quanto o ponto de partida de sua carreira de professora universitária. A autora venceu e foi nomeada a diversos prêmios literários por seus trabalhos, com sua carga criativa expressando-se em meios plurais (séries de romances e novellas infanto-juvenis e adultos, quadrinhos, peças, filmes e séries televisivas) se tornando um grande nome na ficção científica e fantástica – e principalmente africanofuturista – contemporânea. 

É pertinente se atentar ao que isso quer dizer das obras de Okorafor assim como o que elas mesmas podem significar para nós. Um forte padrão na sua escrita, além do que já foi mencionado, são suas personagens femininas africanas e a presença afirmada delas nas narrativas. Da mesma maneira que é possível conectar a existência dessas meninas e mulheres fictícias com a realidade da própria autora, a matéria que as circunda é também desenhada do que é real. É igualmente possível perceber a linha de ficção a qual suas obras pertencem juntamente a outras, herdando a Okorafor a associação com J.K Rowling, Rick Riordan, Neil Gaiman, George R.R Martin, Octavia Butler, Ursula K. Le Guin. Ou seja, a leitura dos romances de Okorafor é ainda mais recomendada aos adultos, crianças e àqueles pegos no meio, já familiarizados com os temas intergalácticos, pós-apocalípticos, distópicos, mágicos, mágico-realistas, solarpunks, e heróicos. A maneira que a autora transforma esses temas é que, ao evidenciá-los em narrativas africanas e femininas, são evidenciados com eles o passado e o presente do continente africano e do próprio globo. 

Embora nem toda obra de Okorafor tenha sido trazida ao Brasil, algumas delas já se encontram traduzidas e publicadas. Os dois primeiros volumes de Bruxa Akata e a trilogia completa de Binti foram publicados respectivamente em 2018, 2022 e 2021 pelo grupo editorial Record, enquanto o seu romance mais adulto, Quem Teme A Morte? foi publicado em 2014 pela Geração. Os três se diferem quanto a idade recomendada de seus leitores em razão deste último confrontar mais diretamente o cenário sombrio de crimes de guerra e de violência em massa que verdadeiramente ocorrem no continente africano e de Binti inclinar-se para esse mesmo lado através de uma trama intergalática. Ao mesmo tempo em que a história da Bruxa, Guerreira e (o último volume não traduzido) Mulher Akata (“carinhosamente apelidada de ’Harry Potter nigeriano’”) atende a um cenário e a um elenco de personagens mais infantis, seu enredo também segue a jornada de uma jovem africana pela salvação mundial contra o crime e a injustiça. 

Partindo desse solo comum às três histórias, pode-se perceber a variação de metáfora e de tom entre elas, sendo Quem teme a morte? a mais grave. Ecoando o discurso do primeiro e único ministro da República Democrática do Congo a favor da revolta contra a força colonial alemã no país, Quem teme a morte? narra a resistência do povo escravizado e aniquilado Okeke por meio da filha do estupro de uma mulher Okeke por um general da tribo Nuro, que conduz o genocídio. Por descender de uma violenta miscigenação, Onyesonwu é considerada uma criança Ewu, ignorada pelos dois povos e direcionada unicamente a uma vida de violência. Por mais que o preconceito e o abandono marquem profundamente a sua vida, são os poderes mágicos, o espírito rebelde e o seu próprio nome (que significa “Quem teme a morte?”) que a moverão.

Ao todo, pode ser avistado nas três narrativas o mesmo objeto que elas descrevem por metáfora: a luta de uma jovem para acabar com a opressão no mundo. De tal modo, suas personagens honram o poema Cartilha de Cura, escrito por Ana Cristina César (1982), “As mulheres e as crianças são as primeiras / que desistem de afundar navios”. 

Publicado por

É graduando em Letras - Inglês/Literaturas na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e bolsista do projeto de extensão Literatura Inglesa Brasil, sob orientação da Profa. Dra. Marcela Santos Brigida.

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